(por: José Rodolpho Assenço)
Guaicuí, hoje Barra de Guaicuí do Município de Várzea do Palma, em Minas Gerais, é um lugar fantástico, envolvido em inúmeros mistérios, mortes e muita ganância. Esse ambiente místico é um dos primeiros povoamentos no sertão mineiro, na região do cerrado.
Inicialmente, foi ocupada pelos índios Cariris, que teriam migrado do nordeste; foi também habitada por uma missão jesuíta em meados do século XVII.
Localizada, estrategicamente, às margens do Rio São Francisco, exatamente na foz do Rio das Velhas, foi conquistada pelo destemido, porém já idoso, bandeirante Fernão Dias Paes Leme, que, além de “peador” de índios para vendê-los como escravo, buscava, incessantemente, esmeraldas. Segundo a lenda, elas se escondiam na Serra encantada de Sabarabuçu, serra essa que ele nunca encontrou.
Não se sabe ao certo quem iniciou a imponente construção da Igreja de Pedra, ou melhor, a Igreja do Senhor de Bom Jesus do Matozinhos, exatamente na foz desse rio. Se, foi o intrépido bandeirante ou a missão jesuítica. De toda forma, essa obra está datada de 1660 a 1679 e foi construída em pedras argamassa de cal e óleo de peixe, entretanto, na realidade, ela nunca foi finalizada.
Enfim, a região foi ocupada pela bandeira de Fernão Dias Paes Leme, que era chefiada por Manuel de Borba Gato, acompanhados de inúmeros sertanistas, caçadores de índios e de esmeralda e ali se instalaram e teriam construído essa bela edificação.
Devido porem, a insalubridade do local, castigado pelas constantes enchentes do Rio das Velhas, acompanhadas de febres e doenças, acometendo diversos deles, inclusive Fernão Dias, que morreu no local e foi enterrado debaixo de uma pedra, próxima à Igreja de pedra.
Incumbiu o bandeirante em seu leito de morte seu filho Garcia Rodrigues, de voltar a São Paulo e entregar as esmeraldas ali encontradas ao governo.
Diante de inúmeras enfermidades e febres, mudaram, em seguida, o arraial para um local mais seco e acima de um morrote, a aproximadamente quatro quilômetros e onde hoje é a vila de Porteiras; construíram ali suas casas e a Igreja de Nossa Senhora de Bom Sucesso, ficando Guaicuí e a Igreja de Bom Jesus de Matozinhos abandonadas.
Porteiras, ao final do século XIX, teve sua decadência e, por fim, a Igreja de Nossa Senhora de Bom Sucesso veio a ruir.
Estive em Guaicuí acompanhado de meus filhos. Além de conhecer pouco essa história, já havia encontrado essa Igreja em 1999, quando de minha ida até Montes Claros, momento em que a descoberta foi por acaso.
Porém, nessa última nova estada, me impressionei com a imensa gameleira que há mais de cinqüenta anos, nasceu sobre as paredes da Igreja de Bom Jesus de Matozinhos, com imensa copa e com centenas de raízes que criam uma mistura única, um monumento da força da obra do homem e da natureza.
Percebi na construção uma sensação de que a Igreja vigia o Rio São Francisco, que se encontra a poucos metros a sua frente.
Impressionou-me como essa obra inacabada conseguiu resistir por tanto tempo e a tantas enchentes, sendo o único resquício da antiga vila de Guaicuí.
As enchentes continuam até hoje, tendo registro da grande última em janeiro de 2012.
Cansados de analisar esse belo monumento da chegada dos bandeirantes colonizadores ao sertão, seguimos em direção ao povoamento de Porteira, para fotografar a Igreja de Nossa Senhora do Bom Sucesso.
Parei o carro e, em seguida, eu e meus filhos descemos, e passamos próximo a um cemitério abandonado, que foi construído ao redor da antiga Igreja; observamos suas ruínas, em especial da única fachada que resta e a qual também tem sua peculiaridade, uma vez que diversos cactos cresceram dentro dessas paredes.
Evitamos, porém, nos aproximar muito, uma vez que aquele local estava com diversos ninhos de marimbondos.
Retornamos a Guaicuí no intuito de conhecer a nova Igreja de Bom Jesus de Matozinhos, obra do início do século XX, pequena igreja com uma torre em madeira segurando um belo sino.
Na nova Igreja, tivemos ainda a oportunidade de conhecer a praça principal de Guaicuí, onde vemos o busto do bandeirante Fernão Dias Paes Leme, fundador desse local.
Ao finalizar essa visita, meus filhos ficaram bastante agradecidos pelo inusitado passeio com uma viagem tão intensa sobre a história do alto sertão mineiro.